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Lídia Pereira “de pedra e cal” na Europa

Em 2019, o presidente do Partido Social Democrata (PSD), Rui Rio, publicou, na rede social Twitter, uma mensagem onde dizia “o futuro passa pelos jovens”. As palavras de remate que davam a conhecer a sua proposta para número 2 da lista do partido ao Parlamento Europeu. Ana Lídia Fernandes Oliveira Pereira, hoje com 29 anos, já traz na bagagem várias conquistas, invulgares para uma jovem desta idade no mundo da política. Natural de Coimbra, confessa desde cedo ter interesse pela política. É a primeira mulher a presidir à maior organização política de juventude da Europa, a Juventude do Partido Popular Europeu (YEPP). Economista, licenciada pela Universidade de Coimbra, concluiu o mestrado no Colégio da Europa e estagiou no Banco Europeu de Investimentos. Hoje é deputada, eleita pelo PSD, ao Parlamento Europeu.

Entrevista feita por Nádia Moura

 

Campeão das Províncias [CP]: É invulgar ver alguém tão jovem no Parlamento Europeu, além de que também lidera a YEPP. A idade não é, por isso, impedimento para “altos voos” mas, ainda assim, notou algum cepticismo por parte dos mais velhos e mais experientes quando chegou ao Parlamento?

Lídia Pereira [LP]: Não. Fui muito bem recebida. Mas, confesso, tive receio que houvesse algum paternalismo na minha chegada lá. Ainda que fosse bem sucedida no meu percurso profissional, na área da economia, poderia ter havido algum paternalismo Poderia ter havido algum paternalismo, mas não, pelo contrário. Incentivaram-me. Mesmo nas intervenções que faço, ou noutros fóruns, sinto que sou ouvida e não sou tratada de forma diferente por ser mais nova. Tenho consciência que não tenho a experiência que outros colegas já têm na política ou mesmo profissionalmente, mas sou muito observadora e aproveito todos os momentos para aprender. Há um ano atrás não teria tanta flexibilidade nalguns assuntos como hoje em dia. Não senti esse cepticismo em momento algum e, até mesmo junto do partido ou outras instituições e órgãos de soberania não tenho essa sensação.

 

[CP]: O convite do presidente do PSD já era esperado?

[LP]: Não, não era. Na política as coisas são um pouco voláteis e nunca podemos dar nada como garantido. Houve aqui um conjunto de circunstâncias que deram origem a esse convite. E, para mim, era uma honra representar o país e os portugueses. Muitas vezes os jovens queixam-se que não são representados, parece que estão sempre numa lógica de serem consultados e não de fazerem parte das decisões. É, no fundo, passar do conselho consultivo ao conselho directivo. A minha integração na lista vai nesse sentido, de se mitigar esta “luta” intergeracional. Este gesto do presidente do partido foi muito bem acolhido e põe a fasquia alta e, assim, mostra que os jovens têm, de facto, oportunidades. Foi uma mudança radical de vida.

 

[CP]: Como é representar mais de um milhão de jovens à frente da Juventude do Partido Popular Europeu?

[LP]: É a maior organização política de juventude. Não é um trabalho fácil, de todo. É uma organização que exige contacto próximo, desenvolvimento de relações e que agrega muitos países, culturas e histórias e, portanto, quando precisamos de decidir algo é muito difícil estarmos todos de acordo. Há uma série de dinâmicas regionais que não é fácil gerir. É uma grande responsabilidade, mas é também uma das coisas que me tem dado muito gozo fazer, aprender estas dinâmicas.

 

[CP]: É, desde julho de 2019, deputada do Parlamento Europeu, eleita pelo PSD. Um balanço deste primeiro ano, com o melhor e o pior momento.

[LP]: O mais difícil foi o momento do Brexit em Janeiro deste ano. Foi um momento muito triste porque eu estava no plenário e, naquele  momento em que votamos o acordo, à minha esquerda estava o partido do Brexit a festejar e a celebrar e, do outro lado do hemiciclo estavam os britânicos muito pesarosos e tristes com o resultado das negociações. Foram momentos tristes porque a ideia que eu tenho da União Europeia é a de um projecto que se foi alargando e não diminuindo e aqui perdemos um dos países que tinha um peso substancial. Mas há sempre luz ao fundo do túnel e não quer dizer que essa situação não possa ser revertida nos próximos anos. Esse foi o momento mais difícil. O melhor momento… recordo a aprovação dos meus primeiros relatórios que vão ao encontro da minha base profissional, sobre o combate à fraude ao IVA no comércio electrónico. Que me deu muito gozo fazer e teve uma votação expressiva, mas sem esquecer que a própria campanha também foi muito gira. Andar no terreno e a importância de ouvir as pessoas.

 

[CP]: Quais os principais focos a que se tem dedicado, particularmente, enquanto membro da Comissão de Economia (além de pertencer também à Comissão de Ambiente e Saúde Pública)?

[LP]: Desde logo as questões relacionadas com branqueamento de capitais e evasão fiscal. Há depois também um outro tema muito importante que é a questão da digitalização, da desmaterialização da moeda e, relacionado com isso, as novas formas de evasão fiscal. Não esquecendo a necessidade de concluir a união bancária, determinar o terceiro pilar, o seguro europeu de depósitos, que põe alguns países com economias mais frágeis numa situação mais complicada. Portugal ainda tem um sistema bancário que, apesar de mais sólido em comparação com a crise de 2011, tem um longo caminho a percorrer. Esses três temas são os mais importantes, se bem que a recuperação económica após a covid-19 será, sem sombra de dúvida, a prioridade nesta altura.

 

[CP]: A sua acção, a maior parte do seu trabalho, incide sobre os temas relacionados com o ambiente. Considera que é a impulsionadora de uma nova geração de jovens que se preocupam com as questões ambientais?

[LP]: A comissão de economia e a do ambiente estão lado a lado porque a questão do ambiente traz uma serie de oportunidades económicas. A economia circular, alterações dos hábitos, desenvolvimento de tecnologias, aposta na inovação para mitigar determinadas situações das nossas vidas e muito mais… economia e ambiente estão ligados e eu faço a ponte entre eles. Relativamente ao ambiente e à adaptação às alterações climáticas foi importante o trabalho, por exemplo, feito pela Greta Thunberg. Ela alertou o mundo para uma realidade que estava a ser descurada. Portugal vai ser (como diz, por exemplo, o relatório da OCDE) um dos países que mais vai sofrer com as alterações climáticas e não podemos ficar impávidos e serenos e pensar que este é um assunto que não nos diz respeito porque não vai acontecer já e não nos vai atingir. É um tema que começa a estar no entendimento de todas as famílias, independentemente da idade. Vejo, muitas vezes até, a preocupação dos mais velhos quanto ao mundo que deixam aos mais novos. Todas as alterações que incutimos na sociedade têm de ter a intervenção de todos. Tem de haver essa preocupação transnacional. Há aqui uma matéria a ser trabalhada para a União Europeia. Em Portugal temos muito a fazer ainda e o país pode ser uma referência na Europa, não só na transição energética.

 

[CP]: Não acha que Portugal demonstra cada vez mais essa preocupação com as alterações climáticas, a sustentabilidade…?

[LP]: Sim, é mais visível, mas ainda temos um longo caminho a percorrer. Há, por exemplo, um aumento de pessoas a fazer reciclagem, mas ainda há sítios onde faltam ecopontos, principalmente na periferia da cidade. Se queremos mais envolvimento de todos é importante providenciar esse tipo de serviço. O país está mais desperto, de facto, mas temos de fazer coisas que sejam realistas e sustentáveis e não fazer só por fazer. O futuro, na questão ambiental, vai passar pelas grandes cidades. É muito importante que as cidades tenham estratégias bem definidas. O Porto parece um bom exemplo neste âmbito e Lisboa é, este ano, a Capital Europeia do Ambiente (algo a que não se tem dado destaque por causa da covid-19).

 

[CP]: Porquê o PSD e não outro partido político?

[LP]: Eu sempre fui muito interessada por política e acho que tem a ver com o ambiente em que cresci, principalmente na escola. Tínhamos uma turma muito participativa. Sou muito pragmática. Sou de centro direita. Não fecho portas a políticas ou propostas que façam sentido e que venham da esquerda. O pluralismo do PSD é de salutar e é isso que enriquece o partido.

 

[CP]: É feliz naquilo que hoje faz ou os planos para o futuro distanciam-se do mundo da política?

[LP]: Há alguns momentos felizes, mas nem sempre tudo corre como esperamos. Acho que a palavra mais indicada é satisfação com o meu percurso. Estou muito satisfeita com o meu trabalho. Muitos acontecimentos, muitas conquistas. Acho que estou no bom caminho. Os planos para o futuro incluem manter este ritmo de trabalho e compromisso. É impossível fazer planos a longo prazo. Há ano e meio não achava que podia vir a ser deputada ao Parlamento Europeu tão jovem… podia acontecer um dia, mas não tão cedo. Como não tenho certezas de nada também não posso garantir o que quero para o futuro. Para já quero aprender e levar toda a minha experiência para continuar na política ou para fazer a minha vida fora dela. É importante esta reciclagem, o “servir” durante um tempo e depois fazer outras coisas com outra bagagem. A política é um estado que até pode ser para a vida até porque eu não tenho aquela visão, muitas vezes negativa, dos políticos profissionais. Sou a favor da delimitação de mandatos, como acontece já com as autarquias. Gosto do que faço, sinto-me confortável. O que não significa que, num determinado momento da minha vida, tenha de ir fazer outra coisa para, quando (se) regressar, o faça de uma forma mais informada ainda.

 

 

Fonte: CAMPEÃO DAS PROVÍNCIAS