Cabe a todos que não nos revemos neste modo de estar, neste modo de ser, manifestar a nossa insatisfação, não calar a nossa revolta.
Termina agosto e a silly season fica para trás. Com a economia em grandes dificuldades e a dívida pública a disparar (subiu 7 pontos percentuais apenas de abril a junho), António Costa já começou a fazer o que faz melhor: desresponsabilizar-se e disparar ameaças e chantagens em todas as direções.
Não há que enganar, António Costa vocifera que prefere uma crise política numa altura em que o Presidente da República não pode dissolver a Assembleia (pela proximidade ao momento de eleições presidenciais) do que negociar um orçamento com o PSD.
Mostrando mais uma vez a fraca matéria do seu caráter, ameaça tudo e todos e não se coíbe de lançar ao charco um país já por si endividado, com uma economia fragilizada e com empresas e trabalhadores em risco. Não que a estatura moral e o sentido de Estado de António Costa alguma vez sugerissem outra coisa, mas para quem ainda tivesse dúvidas fica, novamente, registado para a história.
Recordemo-nos que há um ano e pouco, com a proximidade das europeias, ameaçou demitir-se depois da Assembleia da República, (pasme-se) querer fazer o que lhe compete: legislar. Também dessa vez ameaçou com o caos quando uma maioria parlamentar tinha definido que competia apenas e só ao Governo decidir os termos (e os custos) da recuperação do tempo de serviço dos professores. Agora ameaça os seus parceiros de coligação e o país com o caos.
A única verdade no que diz António Costa aos seus parceiros é que ou se vergam ao poder do aparelho socialista a bem, ou vamos todos arder até haver eleições e serão responsabilizados por isso. Qual Nero, ameaça incendiar a civitas, e entre perder o poder dele e dos seus, ou a destruição de emprego e riqueza, António Costa mostra o seu lado selvagem. Ele ou a terra queimada. Os seus ou a birra com a ameaça da desordem e da destruição. Portugal não tem um adulto a liderar o Governo, tem um adolescente birrento.
A chantagem barata e desprovida de princípios com que nos tem brindado (e como os médicos passaram de merecer esse grande prémio da Champions League em Portugal a uma cambada de cobardes!) mostra que não passa de um Primeiro Ministro indigno do povo português.
Pois bem, se a esquerda não se entender para a aprovação do próximo Orçamento do Estado e o país sofrer com isso, a mais ninguém se não a António Costa essa responsabilidade é imputável.
Professores, Tancos, Pedrógão, Monsaraz e um par de botas. Portugal tem como Primeiro Ministro a reencarnação política de Pôncio Pilatos e caros leitores, com a frequência com que António Costa aparece em público a lavar as mãos de tudo o que corre mal ao Governo que lidera, se usar sabonete em todos esses episódios, está bem a salvo de apanhar qualquer vírus.
Marcelo Rebelo de Sousa disse a uma empresária que o interpelou que a culpa de não haver apoios aos microempresários é dos portugueses que escolheram partidos que sustentam este Governo. É verdade, e fico contente por poder (ao fim de alguns meses) voltar a concordar com o Presidente. A realidade mostra-nos ministros que desertaram no início da pandemia e outros que a cada cavadela, cada minhoca.
Na economia, Siza Vieira depois de medidas e contra medidas em poucas semanas desapareceu. O número 2 de António Costa, e frequentemente contraponto aos radicalismos bloquistas que infetam setores do Partido Socialista, abandonou empresas (e assim empresários e trabalhadores) e achou que estaria melhor à sombra.
Quem já sabemos ter optado por estar à sombra (a beber um drink de fim de tarde) foi Graça Fonseca, ministra da Cultura. Graça Fonseca podia ter optado por ser a voz e a força dos agentes culturais junto do Governo, em vez disso, remeteu-se ao papel de altifalante do Governo, aprendendo como boa aprendiz de António Costa, a fazer de conta que nada é com ela e que todas as críticas são injustas ou infundadas ou desinteressantes.
Na Educação, o inqualificável Tiago Brandão Rodrigues continua a navegar à vista. Os alunos continuam sem qualquer estabilidade, sem qualquer previsão de como decorrerá o ano letivo e as escolas sem orientações fidedignas. Brandão Rodrigues nem resolve nem deixa resolver. O povo português tem uma expressão vernacular para isto, que me coíbo de aqui utilizar.
Cabe a todos que não nos revemos neste modo de estar, neste modo de ser, manifestar a nossa insatisfação, não calar a nossa revolta. Este estado de coisas, este estado do Estado remete-me para um texto antigo, mas intemporal, com que termino este artigo.
“Em todos os tempos, os opressores disseram aos oprimidos que se deixassem guiar passivamente pelas suas mãos de ferro, porque só aos eleitos era dado conhecer os ínvios caminhos da redenção terrena. E em todos os tempos os oprimidos lhes responderam com um safanão nos grilhões. É o que fazemos também nós, neste momento, cada qual com a indignação que pode;” [1]
[1] Parte de texto de Miguel Torga preparado para ser lido numa reunião que foi proibida, em 1951
Fonte: ECO