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Os dias D – Decidir e Defender a Economia

Está na hora de os líderes europeus fazerem a sua parte. O Conselho Europeu tem a oportunidade de mostrar que está à altura do tempo histórico que vivemos. Não sabemos se lhes será dada uma outra oportunidade.

 

A União Europeia enfrenta um momento decisivo. A prioridade é o combate à crise sanitária, mas temos de ter o mesmo nível de empenho na mitigação das consequências económicas que já conseguimos antecipar. Os governos dos Estados-membros têm de estar comprometidos na construção de respostas conjuntas, como na sua boa execução em cada país. No Conselho Europeu espera-se mais ambição e coragem.

Em cada país, espera-se rapidez e eficácia na transformação de apoios europeus em políticas nacionais que cheguem às famílias e às empresas. Diferir impostos no tempo é uma ajuda temporária, mas os tempos exigem um maior alívio fiscal, com a supressão de algumas obrigações fiscais. A criação de linhas de crédito ajuda à liquidez imediata das empresas, mas com custos totais entre 3% e 4% (entre spreads, comissões e custos de garantia) podemos estar apenas a garantir o imediato e a adiar (e a agravar) dificuldades sérias. E, por outro lado, seria oportuno refletir sobre alguns investimentos públicos: será prudente insistir em grandes obras públicas (como o novo aeroporto que o Governo rejeita reavaliar) quando podíamos aproveitar este impulso para tornar o investimento mais inteligente e mais focado na transição digital e ambiental? Um governo que quer liderar o discurso na Europa tem de liderar pelo exemplo, dentro de portas.

As conclusões do Eurogrupo, entre recusas de soluções (expressas no caso do resseguro de desemprego ou tácitas na mutualização da dívida) e redações vagas (“custos diretos e indiretos” do combate à pandemia), ficaram aquém das expectativas. O Conselho pode ir além das expectativas e os tempos que vivemos exigem que assim seja.

Em primeiro lugar temos o Fundo de Recuperação (“Recovery Fund”) e o seu financiamento. É aqui que se espera o maior nível de ambição. Se o choque simétrico da pandemia custa a todos por igual e se vamos enfrentá-lo em conjunto, faz sentido partilharmos o esforço. Não é apenas solidariedade, mas pragmatismo. Faz sentido discutirmos os recursos próprios da União, mas sobretudo a emissão de títulos de dívida em conjunto que possam financiar um fundo que chegue rapidamente à economia, às empresas e às famílias. É isto que o Parlamento pede quando fala em “recovery bonds”!

Em segundo lugar, temos o SURE, o programa para ajudar ao financiamento dos regimes nacionais de redução do tempo de trabalho e de preservação do rendimento dos trabalhadores. Também aqui podemos discutir a suficiência da dimensão financeira (100 mil milhões de euros), mas sobretudo a agilização dos empréstimos que prevê. Novamente, é o conceito de “condições favoráveis” que os líderes devem clarificar. Em Portugal, à medida que o tempo passa, falamos de milhares de milhões de euros (só com o lay-off), mas o que importa saber é quando esse dinheiro vai chegar às empresas e como vai garantir os empregos que estas representam.

Em terceiro lugar, temos a mobilização do Banco Europeu de Investimento. O compromisso do BEI pode resultar em 200 mil milhões de euros de financiamento para as empresas (com especial foco nas pequenas e médias empresas), mas precisamos de um mandato claro e a definição detalhada do papel dos bancos nacionais de fomento. Aqui, a realidade é muito diferente de país para país e não podemos correr o risco de 27 pontos de partida demasiado diferentes. Em Portugal, por exemplo, está o Sistema Português de Garantia Mútua capacitado para dar a resposta que as empresas precisam, em tempo? Creio que não. Se continuarmos espartilhados em burocracias administrativas, perdemos recursos e tempo preciosos, que podem custar falências e empregos.

Aqui chegados, a conclusão sobre o Quadro Financeiro Plurianual (o orçamento europeu para 2021-2027) é evidente: não é suficiente. O Parlamento tem sido a instituição mais ambiciosa nas propostas: 1,3% do Rendimento Nacional Bruto da UE. Parece claro que nem esta proposta “ambiciosa” será suficiente para a resposta que precisamos. O atual QFP termina em 31 de dezembro e um acordo deixou de ser urgente, para passar a ser outra verdadeira emergência europeia.

Todos os dias aplaudimos os profissionais que estão na linha da frente. Todos os dias, os europeus fazem a sua parte, ficando em casa. Todos os dias, empresas europeias produzem bens e prestam serviços essenciais. Está na hora de os líderes europeus fazerem a sua parte. O Conselho Europeu tem a oportunidade de mostrar que está à altura do tempo histórico que vivemos. Não sabemos se lhes será dada uma outra oportunidade.

 

Fonte: JORNAL DE NEGÓCIOS