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Sem donos

Celebramos amanhã mais um aniversário de um dos momentos fundadores da democracia portuguesa. Não era nascida e, por isso, não vivi nem participei do calor e da novidade daquela altura.

Na escola, nos livros e documentários estudei a memória histórica desse período que se perpetua no tempo e lembro, por isso, o 25 de Abril como a data que abriu portas à liberdade. Vivo este dia com o entusiasmo próprio de quem, não tendo vivido o tempo revolucionário, reconhece a importância histórica do momento e, sobretudo, de quem está inconformada com o incumprimento das promessas de Abril, quase cinco décadas depois.

A geração que, em 1974, fez a Revolução, abriu caminho à aprovação da Constituição que celebra, também amanhã, 45 anos de vigência. Constituição que instituiu o Estado de direito democrático que conhecemos e que permitiu a Portugal caminhar rumo à adesão à comunidade europeia, o que veio a acontecer uma década depois. A Constituição é um reduto dos direitos conquistados em Abril e o maior símbolo do compromisso de Portugal com os Direitos Humanos e com uma identidade profundamente europeia e global.

Hoje, a generalidade da geração que governa o país não fez o 25 de Abril. É a geração que assistiu, muito jovem, à Revolução. É a geração que está a falhar naquilo que Abril melhor significa: na construção de uma ideia de um país livre e de um futuro coletivo com oportunidades para todos.

Nos primeiros 20 anos de democracia, o país mudou. A integração europeia alimentou a expansão da economia, os salários cresceram, os portugueses tiveram cada vez mais acesso a escolas, hospitais e universidades de qualidade. No entanto, o impulso e pujança de modernização parecem ter perdido fulgor. Entre crises económicas e gestão corrente Portugal carece hoje de uma visão inspiradora semelhante àquela que fundou a democracia.

Em 1974 urgia a Portugal “Descolonizar, democratizar e desenvolver”. Em 2021, apenas a descolonização se fez, nas circunstâncias que conhecemos. A nossa democracia sobrevive com uma fraca participação dos cidadãos, que diminui de eleição para eleição. O nosso desenvolvimento deixa muito a desejar e, nas últimas décadas, temos ficado para trás nos níveis de crescimento. Deixámos, há muito, o “pelotão da frente” da Europa.

Este é o grande desafio da minha geração, que não fez, viveu ou assistiu ao 25 de Abril: a renovação da esperança. Temos de ser mais “pais do nosso futuro que filhos do nosso passado”.

Fonte: JN